Campo Grande (MS) – Em Mato Grosso do Sul, dos 913 custodiados da Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen), que realizaram as provas do Exame Nacional do Ensino Médio para Pessoas Privadas de Liberdade (Enem/PPL), no ano passado, 529 conseguiram aprovação total ou parcial, conforme dados da Divisão de Educação da instituição, o que representa 58% de aproveitamento.
Entre os aprovados, 64 reclusos conseguiram certificação total, ou seja, atingiram boas notas em todas as disciplinas. Entre eles, sete se destacaram e alcançaram média que os qualificam para cursarem o ensino superior através dos programas oferecidos pelo Ministério da Educação.
Michael Lobato Coutinho é um dos que prestaram o exame quando estava cumprindo pena na Unidade Penal “Ricardo Brandão”, em Ponta Porã. Com 742 pontos na nota de corte, conquistou uma vaga no curso “Sistema de Informações” da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Agora em regime semiaberto, o reeducando já garantiu sua pré-matrícula e sonha com as oportunidades que podem se abrir.
“Sempre sonhei em fazer programação de computador e decidi tentar uma vaga na universidade, através do Enem prisional, pois tempo eu tinha para estudar”, comenta Michael, revelando que emprestava livros e apostilas da biblioteca do estabelecimento prisional para se preparar para as provas. “É muito importante o ensino dentro presídio, assim como a existência da biblioteca e a oportunidade de também participarmos do Enem”, ressalta.
Preso durante dois anos e oito meses no regime fechado, por tráfico de entorpecentes, Michael – agora em cumprimento de semiliberdade – destaca que o estudo foi fundamental para ter uma nova perspectiva de vida. “Percebi que o melhor caminho para melhorar de vida é estudar, pois o crime pode até dar dinheiro, mas você não tem paz e pode perder tudo, o conhecimento e o que você pode fazer com ele ninguém tira”, declara.
Segundo a chefe da Divisão de Educação da Agepen, Rita de Cássia Fonseca Argolo, apesar dos bons resultados, o principal foco do Enem PPL é a certificação do ensino médio, principalmente no caso dos internos do regime fechado, que necessitariam de autorização judicial e até mesmo escolta policial para conseguirem cursar uma faculdade. “O caso de Michael é mais simples, pois no regime semiaberto basta a autorização judicial’, explica. Conforme ela, os outros seis apenados aprovados estão todos no regime fechado e são de unidades de Aquidauana, Jardim, Corumbá e Ponta Porã.
Mais exemplos
Outro exemplo de sucesso no Enem prisional vem, também, da Unidade Penal Ricardo Brandão, Rafael Antunes de Brito conseguiu 920 pontos na redação, após horas e horas de estudo, compartilhadas com o então companheiro de cárcere Michael. Ele alcançou média para o curso de Sistemas de Informação da UFMS, mas, por estar em regime fechado, a maior esperança, agora, é conseguir segurar a vaga para o ano que vem, tendo em vista que o benefício de progressão de regime deve acontecer em outubro próximo.
Resultados positivos foram conquistados, ainda, por A. F. dos S. e L. de O. F, reclusos no Estabelecimento Penal de Aquidauana (EPA), que conseguiram média para estudar na maior universidade pública do Estado, nas faculdades de Matemática e Turismo, respectivamente. No entanto, devido às aulas serem presenciais, as boas notas, possivelmente, servirão mais como estímulo, conforme declaram os próprios internos. “O estudo pode mudar qualquer situação, principalmente a de quem está preso”, ressaltou o primeiro. “Quero continuar estudando, tenho vontade de fazer outros cursos. Estudar é muito importante para minha vida profissional. E eu vou continuar”, completou o outro.
Foco na educação
Inserida nessa ótica, a educação, em todos os seus níveis, tem sido uma das principais apostas da Agepen objetivando a promoção da reinserção social, com uma política educacional implantada nos estabelecimentos penais do Estado em conjunto com a Secretaria de Estado de Educação. “Recebemos um público que não tem a cultura de estudar, então temos incentivado, assim que eles adentram ao sistema, a buscarem a educação como um meio de modificarem suas vidas e terem novas oportunidades na sociedade; e isso, tem surtido um resultado muito positivo”, comenta diretora de Assistência Penitenciária da Agepen, Elaine Arima Xavier Castro.
Esse incentivo tem refletido em índices positivos para Agepen, já que além das aprovações no Enem e possibilidade de ingresso em universidades, aos detentos também são ofertadas oportunidades de cursar a faculdade dentro do próprio presídio, por meio de parcerias da agência penitenciária com instituições educacionais, além do ensino regular oferecido pela Escola Estadual Polo “Regina Anffe Nunes Betine”, criada exclusivamente para atender ao sistema prisional.
Levantamento da Diretoria de Assistência Penitenciária da Agepen revela que, durante o ano de 2016, 24 reeducandos cursaram ensino superior dentro das unidades prisionais do Estado; com acesso às plataformas on line de ensino; outros 2200 frequentaram os ensinos fundamental e médio pelo sistema de Educação de Jovens e Adultos (EJA), além 800 terem participado de capacitações profissionais. Até mesmo o acesso à pós-graduação é possibilitado, com dois internos da Capital se especializando em Coaching e Liderança, atualmente.
Para o diretor-presidente da Agepen, Aud de Oliveira Chaves, “o ensino e a qualificação profissional dos reeducandos, associados à oportunização de trabalho digno, são essenciais para que estejam preparados para uma vida com novos valores e para que sejam reinseridos na sociedade, não reincidindo na prática criminal, o que reflete diretamente na redução dos índices de violência”.
Reportagem Keila Oliveira Assecom/Sejusp